segunda-feira, 19 de julho de 2010

UM CONCERTO NA PROVINCIA (1964)


VITOR GOMES E OS GATOS NEGROS
No verão de 1964, a banda actua na pacata cidade de Tavira. Pelos vistos, muita gente não estava preparada para o que assistiu...
"... Ah! Já nos esquecíamos; Vitor Gomes e os seus "Gatos Negros" também foi bom, não haja dúvida. Nunca se esperou mesmo que aquilo fosse tão bom. Vale até a pena duas palavras sobre isto.
Muita gente não faz a menor ideia do que sejam "Gatos Negros" e o arriscado trabalho a que se expõem; não faz nem pode, pudera, mas realmente trata-se de um curiosíssimo fenómeno que nos deixa perplexos, estupefactos e obliquados em relação ao centro da terra.
Trata-se de um conjunto de quatro espécimes de felinos raros que, com as suas violas eléctricas - claro -, fazem cortina sonora às arriscadas demonstrações de epilépsia aguda de um quinto felino, este muito mais responsável.
Pois estes "gatos", quando se põem a gatear é um caso muito sério e pode-se garantir que, dos outros gatos negros, vulgares ou amarelos malhados, ou mesmo pardos, não fica um só para a amostra num raio de dois quilómetros em volta. Olha que raio! Fogem de pelo eriçado e pupilas incendiadas como se levassem um foguetão "Rangel" instalado na separação das coxas. E, nota curiosa, enquanto estes andam com as quatro patas, aqueles caminham apenas em duas, perdão, queremos dizer dois pés, pelo que, não há dúvida nenhuma, são parecidíssimos com pessoas, apesar de a si mesmo se intitularem "Gatos".
Apresentam-se convenientemente vestidos de sola preta de baixo a cima, lembrando grandes sapatos empinados ao alto, e devem estar em greve com todos os barbeiros do mundo. As trunfas ensombram-lhes o olhar cavo e duro, de quem congemina terríficas vinganças.
Só de -los já é bom, um deleite, mas a coisa não fica por aqui.
Quando lhes dá a urticaria nas violas e coçam para ali que é um louvor a Deus, é que a coisa entra realmente a animar. Nem se faz ideia da quantidade de música de sola que cabe dentro duns instrumentozinhos tão frágeis. E tudo twistes, ainda por cima. A propósito, já repararam que os twistes são todos iguais?
Sim senhor, mas ainda a musica é o menos. Isso seria uma vulgar, corriqueiríssima banalidade insossa e suporífica.
Quando Vitor (quinto Gato) entra de roldão, todo empenado e a berrar tanto que nem se sabe se tem a espinha partida, então é que são elas.
A asistencia que já está muda, muda então de posição e de cuidados, nunca sabendo o que pode sair dali.
Depois de Vitor berrar os sete farrapos em várias posições, berra de cócoras muito irritado, não se sabe porquê. Os demais "Gatos" também se põem de cócoras mas menos irritados. Depois arroja-se ao chão - que arrojo! - os Gatos também. Tudo estendido a coçar na barriga. Então Vitor põe o microfone de pés para o ar e revolea-se no sobrado, lembrando os besouros quando de barriga para cima se querem voltar. Os "Gatos" também, mas estes apenas lembram carochas.
Findo isto, Vitor que pretende do público um rugido de gozo que nunca mais chega. - que público estúpido! -, enfada-se, pára com a charanga, põe-se direito - aí é que se vê que tem a coluna vertebral em bom estado -, e diz que assim não pode ser. Ou o público colabora ou não há nada feito. Isto é: um fiasco.
Esta colaboração consiste em o público marcar palmas, flectir as pernas afastadas, menear os quadris descendo até bater com o traseiro no chão. Os braços, que devem estar dobrados, fazem para a frente e para trás, até cheirar a alho. Segundo nos informara, isto é que é dançar o twiste. Todavia, parece que os melhores dançarinos, são os que conseguem tocar com aquela região glútea debaixo do chão, isto é, em alçapão.
A este apelo, alguns adolescentes, uns mais impubres que outros, subiram ao tablado e entraram activamente a joeirar no estilo, com grande gáudio da gataria, pelo qual o Vitor se pôs de pé sobre o piano; isto na impossibilidade de subir aos telhados adjacentes que era, na verdade, o local ideal e típico para as actuações deste conjunto.
Alguns gailoes pançudos, carenas ou artísticos, para se dar ares de jovens e de que andam em dia com a moda, mesmo a mais estúpida, pouco depois entraram também a rebolar as banhas e as varizes, o que deu origem a que muito público deixasse de ligar aos "Gatos" só para os ver.
Nota: uma garota até fez um entorse num pé.
Que coisa bela, que espectáculo, que bom!
Depois destes sucessos, ou desastres, os "GATOS" foram-se embora.
O público de Tavira que, por sentido de dignidade havia resistido, já estava ridicularizado; logo, nada mais havia a fazer.
Foram-se.
Ouvimos depois dizer que contam ir para o sertão africano fazer o mesmo aos pretos e isso é que chocou.
Coitados, mais este azar.
O que faz sofrer o preço da civilização."
Por Sebastião Leiria, em "Jornal do Algarve" de 22/08/1964
- Os meus pais assistiram a este concerto e ainda hoje se recordam da cara de espanto das pessoas ao verem a entrada do Vitor Gomes no palco aos "pinotes".

CONJUNTO ACADÉMICO JOÃO PAULO (1967)

EP COLUMBIA, 1967

Este é o primeiro lançamento do conjunto no ano de 1967. A própria capa reflecte uma novidade, a nova ponte sobre o Tejo. Por esta altura, todos os elementos do grupo estavam na "tropa", mesmo os elementos que ainda eram demasiado jovens para estarem, como era o caso de Ângelo Moura, o baixista do grupo.
Deste EP, destaco duas musicas: "Poema de um homem só" e "Oásis". Para variar, os melhores temas dos discos eram originais do conjunto. "Poema..." é uma belíssima musica com toques psicadélicos. E com toda a certeza que se tivesse chegado a ir ao Festival da Canção poderia ter chegado ao lugar cimeiro. O segundo tema, "Oásis", musica inspirada nas viagens do conjunto por terras de África, tem um arranjo muito ao estilo da "West Coast". Os restantes dois temas estão interessante.
Outra coisa interessante deste disco, é a contra-capa e o seu texto. Outros tempos...